Antes de criticar a ciência, preciso me apresentar: sou ateu, especialmente cético em relação à minha própria percepção de mundo, e também que fique claro que desejaria viver para sempre. Vejo a ciência como a coisa mais democrática que existe e a ferramenta mais poderosa que o ser humano possui.
Cientistas e filósofos são, ambos, muito preocupados com impossibilidades. Os cientistas gostam de mostrar que as coisas amplamente consideradas impossíveis são, na verdade, totalmente possíveis. Os filósofos, em contrapartida, são mais inclinados a demonstrar que coisas amplamente consideradas como, perfeitamente, viáveis, são de fato impossíveis.
É inegável que a ideia do impossível faz sinos alarmantes tocarem na mente de muitos, mas não sejamos partidários, expandemos nossa visão. Paradoxalmente, a ciência só é possível porque algumas coisas são de fato impossíveis. As provas incontestáveis de que a Natureza é governada por "leis" confiáveis, é o que nos permite separar o possível do impossível.
Para alguns, qualquer sugestão de que possa haver limites para a cognição e compreensão humana, especialmente ao progresso científico, aparece como um meme (ideia, vírus) perigoso que gera desconfiança e repulsa. Igualmente acríticos são aqueles que, entusiasticamente, abraçam qualquer sugestão de que a ciência pode ser limitada porque suspeitam dos motivos e perigos, com um medo desenfreado da investigação do desconhecido.
Lembremos que a cada final de século parece surgir um novo inventário em ciência. Também não podemos negar que, desde o último século, seus passos foram grandiosos e a teoria científica adquiriu sucesso, tanto na quantidade, quanto na qualidade - a partir de suas previsões precisas.
Mas então que algo de estranho e inesperado acontece. Somos contrariados pelas teorias e Natureza.
Um dos lados se sobressai, prevêem que há coisas que não podemos prever, observações que não podem ser formuladas, declarações cuja verdade não se pode afirmar, nem negar. Revela-se uma inconsistência interna, a teoria produz um "no-go".
Ela acaba por ser não apenas um alcance limitado, mas “auto-limitado”, como diz o cientista e professor John D. Barrow. Filósofos e cientistas começam a questionar sobre a esperança de uma ciência do futuro explicar o “como” de tudo, e até se o fim da descoberta científica está a vista.
Autores como Roger Penrose e John D. Barrow olham por outra perspectiva, não apocalíptica, e sugerem que este seria um bom sinal. Poderiamos começar a reconhecer as teorias científicas maduras o suficiente para indicar seus próprios limites, ou auto-limites. Tais limites surgiriam não apenas porque as teorias são imprecisas ou inadequadas, mas podem nos dizer algo profundo sobre a natureza do conhecimento e as implicações de se investigar o Universo de dentro.
A questão dos limites da ciência tem grande importância para que possamos olhar para nós mesmos (seres humanos), e percebermos em que grau de evolução estamos - a partir da observação dos problemas que até então são impossíveis de serem resolvidos.
Digo, podem existir limites impostos pela natureza da nossa humanidade. Tudo indica que o cérebro humano não foi feito para evoluir tendo a ciência em mente – como nos esquecemos. A investigação científica, assim como nossos sentidos artísticos, são subprodutos de uma mescla de atributos que sobreviveu porque, preferencialmente, estavam mais bem adaptados para sobreviver em ambientes que enfrentaram - num passado distante. É de se suspeitar que essas origens ambíguas poderão comprometer a nossa busca por uma compreensão do Universo.
Nossa investigação do mundo surge toda através do raciocínio e lógica humana, caso haja um limite, a priori, nessa nossa percepção, estaremos fadados ao fracasso procurando respostas por este caminho. De fato, o que sabemos é que os limites e barreiras que não podem ser atravessados, que não podem ser conhecidos, o que não pode ser feito, e nem visto, definem o nosso Universo da forma como o conhecemos, ou como podemos conhecer.
É fácil pensar sobre a história do sucesso científico, mas tenho outra história para contar: aquela que não fala sobre o conhecido, mas do desconhecido; das coisas impossíveis, de limites e barreiras que não podem ser atravessados. Talvez isso soe um tanto perverso. No entanto, o impossível é uma poderosa e persistente noção. Despercebida, sua influência sobre a nossa condição é profunda e ampla, e seu lugar na nossa imagem do Universo no mais profundo nível é inegável.
O objetivo é descobrir alguns dos limites da ciência para ver como nossa mente, diante a consciência do impossível, nos dá uma nova perspectiva sobre a realidade.
Se um cientista diz que algo é possível, ele certamente tem razão, mas se ele diz que algo é impossível ele provavelmente está errado? Dependendo do assunto sobre o qual está sendo questionado, não. E é sobre isto que os convido a explorar.
Eis os grandes mistérios à percepção humana que estancam nossa investigação: o Teorema de Gödel e o Princípio da Incerteza de Heisenberg.
Comecemos pelo Teorema de Gödel. No início do último século, o mundo parecia simples o suficiente para ser totalmente conhecido. Observações do mundo eram feitas; padrões discernidos e descritos por fórmulas matemáticas. As fórmulas previam mais e mais do que era visto; nossa confiança em seu poder explicativo e preditivo só crescia. Desta forma, por um longo período de tempo, as fórmulas pareciam ser infalíveis. Alguns começavam a argumentar que os cientistas nos permitirão entender tudo. Outros diziam que o fim de um ramo da investigação humana estaria à vista! Tudo seria revelado! Livros começam a ser escritos e prêmios começam a ser entregues através de comemorações majestosas com grande exposição popular. O desejo profundamente humano, em nossas vísceras, de ligar todas as coisas, começava a ser saciado.
Observamos na história que a noção do “tudo é possível” tem uma longa história ligada aos desejos humanos – principalmente os religiosos. A maioria das culturas humanas demonstra um desejo de adorar ou reconhecer seres ou espíritos superiores a si mesmos. Esses "deuses" são geralmente creditados com poderes sobre-humanos: é o que os distingue dos simples mortais humanos. Seus poderes podem ser amplitudes do que já faz um ser humano, ou poderes que os seres humanos não possuem em medida alguma. No caso mais extremo dos deuses, podem possuir poderes ilimitados que lhes permitam saber de tudo e fazer tudo. Mas alguns fiéis da ciência aos poucos começaram a perceber que “O Dia” nunca chegaria. Assim, muitos acabaram por migrar este desejo para correntes de pensamentos engessados, ditos, pseudocientíficos, tal como a Cabala e Parapsicologia.
Kurt Gödel foi o responsável por uma parcela especial da destruição da “fé científica”. Graduado em Matemática, e doutorado em Filosofia, Gödel provou de maneira lógica, formal e irrefutável que há limites para o conhecimento dos limites da mais pura das ciências.
Titulado de Teorema da Incompletude, o Teorema de Gödel demonstra como uma máquina, ou um computador, teria problemas em avançar muito na matemática. É fato que os computadores são bons para cálculos, mas frente a uma questão que não possa ser provada verdadeira ou falsa, um paradoxo, o computador poderia travar, o robô poderia exclamar “Isso não pode ser computado!” e seu cérebro artificial explodiria, fazendo referência às mais antigas obras de ficção científica.
A palavra "paradoxo" é uma síntese de duas palavras gregas, “para” que significa algo semelhante a “contrário a”, e “doxos” que significa “crença”, assim, “crença contrário a”. Ou seja, algo que parece contraditório, mas que é, de fato, verdadeiro, ou algo que parece verdadeiro, mas que é, de fato, contraditório, ou uma corrente inofensiva de deduções a partir de uma auto-evidencia do ponto de partida que leva a uma contradição.
O fato é que paradoxos têm desempenhado um papel dramático na história intelectual, muitas vezes antecipando desenvolvimentos revolucionários na ciência, matemática e lógica. Sempre que, em qualquer disciplina, descobrimos um problema que não pode ser resolvido dentro do quadro conceitual que, supostamente, deveria aplicar-se, nós experimentamos o choque do paradoxo. Este choque pode obrigar-nos a descartar o antigo quadro e adotar um novo.
É a este processo das mudanças intelectuais que devemos o nascimento de muitas das principais ideias em matemática e ciências. Desde pequeno, muito questionador e até chamado de “Sr. Porque” (por conta do grande número de perguntas que fazia), Gödel levava isto um tanto a sério. Para ele, a capacidade de enxergar além destes paradoxos indicava o fato de não sermos robôs, que estamos acima das máquinas. Seríamos compostos de algo mais do que a simples mecânica de 1+1=2.
Esta crença em ‘algo mais’ foi uma constante na vida de Gödel. Uma de suas maiores pretensões era transformar a metafísica em uma ciência exata. Assim, talvez não seja uma surpresa que tenha trabalhado por décadas por uma prova formal sobre a existência de Deus – mas não obteve sucesso, tal qual seu Teorema da Incompletude. Mas independente da razão que o motivou, os ditos “fenômenos não computáveis” são um desafio real para a ciência, com ou sem crença.
Que não somos limitados como computadores aritméticos é evidente. O que também deve ser evidente é que é mais comum que pensemos de forma ilógica e incoerente. E Gödel via nossa capacidade de enxergar uma declaração como verdadeira ou falsa como derivada de uma lógica maior, a evidência, contudo, sugere que nossas certezas podem ser, não raro, fruto de simples arbitrariedades, desenvolvidas e racionalizadas a posteriori de forma inconsciente. Uma moeda lançada ao ar também pode decidir entre cara ou coroa, sem nenhum sistema axiomático ou conexão com uma entidade maior e perfeita.
Ironicamente, a própria fé metafísica de Kurt Gödel pode ser vista como uma destas arbitrariedades ultimamente incoerentes. Se ela o levou a desenvolver e provar algumas das mais revolucionárias ideias na história das ideias, no entanto, está mais do que demonstrado o valor do acaso.
Esta forma de gerar um paradoxo, fazendo com que uma declaração faça referência a si mesma, foi o truque que o matemático Kurt Gödel utilizou em 1931 para provar seus Teoremas de Incompletude, entre as mais importantes descobertas científicas e filosóficas do século passado.
O Teorema diz que o enunciado não pode ser simultaneamente completo e consistente, e caso o sistema seja consistente, sua consistência não pode ser provada internamente ao sistema. Um exemplo:
Caso seja verdadeira, eu não estaria dizendo a verdade, assim existiria uma inconsistência nesta atual afirmação. Mas caso esta afirmação seja falsa, sendo assim eu diga a verdade, então existe também uma inconsistência, pois então eu estou dizendo a verdade sobre nunca dizer a verdade.
Este é um tipo de problema, até então, sem solução, que demonstra o que Kurt Gödel pretendeu exprimir com o Teorema de Incompletude.
Esta trágica história começou por cerca do início do século XX, logo após as diversas e mais complexas áreas da ciência terem passado por uma Era de Ouro e se assentarem com confiança sobre a mesma. Uma das maiores obras representando este ideal foi o “Princípio Matemático” (traduzido) de Whitehead e Russell.
Com os limites de Isaac Newton, contudo, suas leis impunham ordem no mundo. Uma das mais brilhantes de uma série de todo tipo de leis naturais, que ordenaram e ampliaram nosso domínio e conhecimento da natureza, iluminando com certezas o que antes era incerto e ambíguo.
E o poder e precisão científicos só aumentavam, até o ponto em que se descobriram os átomos e suas propriedades, e foram nelas que a ciência descobriu, para desagrado de sua ambição, a primeira grande barreira: o Princípio da Indeterminação.
O responsável foi Werner Karl Heisenberg, físico alemão, que descobriu um limite para o conhecimento humano, uma indeterminação de como as estruturas pequenas do nosso Universo devem se comportar. Para os mais espirituais, a arbitrariedade é apenas um sinal de que “tudo é possível” (como no famoso documentário “Quem Somos Nós?”), já para os mais sensatos, um abismo se abria diante nossos olhos. Por um lado, nos permite uma perspectiva maior da nossa realidade, por outro, nos afastava um pouco da nossa compreensão do Universo.
A física quântica é o ramo da ciência que estuda esses eventos complexos. Ela nasce, basicamente, quando os físicos descobrem que quantizando quantidades como a energia da órbita do elétron em torno de um átomo, chegavam a resultados satisfatórios - pela física clássica, um corpo emitiria radiação com energia infinita -, e formulações matemáticas que levavam a contradições. Assim, a radiação de corpo negro, o efeito fotoelétrico e a quantização das órbitas eletrônicas são a pré-quânticas.
A indeterminação é vista através do processo de medida mais evidente e claro para a observação, realizado a partir da utilização de um fóton de luz, que pela sua natureza proporciona a “melhor” observação possível, no entanto abre portas para um mundo indeterminado – impondo um limite para uma evolução de sua observação.
Nas palavras de John D. Barrow, especialista no assunto:
“A teoria quântica nos ensina que todos os objetos possuem um aspecto wave-like. Este aspecto é wave-like no sentido de uma onda de crimes, ao invés de uma onda de água. Ou seja, é uma onda de informações. Se uma onda de neutron passar através de seu detector, isso diz a você que um neutron é mais provável de ser detectado lá. O comprimento desta onda em questão é inversamente proporcional ao seu tamanho físico. Quando um objeto tem comprimento de onda quântica que é maior do que seu tamanho físico ele se comporta em um modo abertamente quantum; Quando seu comprimento de onda é menor do que seu tamanho, se comporta na forma clássica de Newton.” (BARROW, John D. The Limits of Science and The Science of The Limits. 1998, pg. 20.) [tradução minha].
Assim, o comportamento clássico é apenas o limite extremo do comportamento quântico, quando o tamanho físico de um objeto é muito maior do que seu comprimento de onda quântica. O intrigante é que, no mundo quântico, algumas coisas clássicas impossíveis se tornam possíveis e algumas coisas classicamente possíveis acabam por ser impossíveis.
Por exemplo, em ciência newtoniana clássica, assumimos que é possível conhecer, simultaneamente, a posição e o movimento de uma partícula com uma precisão absoluta. Na prática, pode haver limites tecnológicos para a precisão com que isso poderia ser feito, mas não há razão para esperar resultados contraditórios com a tecnologia necessária em mãos. O esperado é que a tecnologia permitiria uma precisão ainda maior. Mas a mecânica quântica nos ensina que, mesmo com os instrumentos ideais, é impossível medir a localização e a velocidade de um corpo simultaneamente com uma precisão melhor do que alguns limites críticos definidos pela constante de Planck – a priori pela natureza.
Assim, o nobel de física, Heisenberg, nos ensina que “o cientista não é como um observador de pássaros em um esconderijo perfeito”.
Mas não estamos aqui celebrando um fracasso fundamental da Ciência, pelo contrário, é um atestado poderoso de que a maior descoberta dos cientistas é a própria Ciência, capaz de descobrir limites a seus limites, e com isto, o vislumbre de uma infinitude de caminhos a perseguir. E essa infinitude indeterminada surge, paradoxalmente, de uma história rumo ao encontro de limitações.
Na mecânica quântica, nada pode ser observado com alguma probabilidade, embora essa probabilidade possa ser muito pequena (remetendo à obra “O Andar Do Bêbado”, do físico Leonard Mlodinow). No entanto, ainda que não tão arbitrária, a mecânica quântica não deve ser vista como uma mágica mística que permite tudo, mas de fato como uma ciência precisa que dita mais limitações, de uma natureza diferente.
Para aqueles presos ao paradigma clássico científico, muito se cogitou que este limite imposto pela física quântica seja algum mal-entendido, mas é indiscutível que muitos experimentos sugerem o contrário.
Como exemplo, um experimento foi determinante para a física quântica (análogo ao realizado por Young no século XIII) ao revelar uma realidade perturbadora para o consenso científico da época. Realizado com um fóton, partícula da luz, e usando uma montagem de placas geralmente utilizadas para detectar o fenômeno de interferência de ondas, observou-se o comportamento das partículas atômicas quando submetidas ao mesmo processo.
Como vemos na primeira imagem, quando passa pelos orifícios da primeira placa, um feixe de ondas dá origem a dois feixes que interagem entre si, o que termina em um registro na segunda placa das intensidades das ondas que a atingem, definido como uma seqüência de máximos e mínimos, ou seja, um perfil oscilatório. Na segunda imagem, em vez de usar um emissor de ondas, bombardeou-se a primeira placa com elétrons e nêutrons. O esperado era que os registros dos impactos destas partículas na segunda placa formassem duas concentrações distintas, definidas pelas trajetórias das partículas através dos orifícios.
Na análise de Max Planck, o surpreendente resultado mostrou um perfil para os impactos das partículas na segunda placa muito semelhante ao apresentado pelas emissões de ondas, com máximos e mínimos de característica tipicamente oscilatória distribuídos ao longo da superfície alvo. Planck também observou que quando tapava um dos orifícios de modo a ter certeza sobre a trajetória das partículas, estas registravam apenas uma concentração de impactos na segunda placa, evidenciando um comportamento corpuscular, totalmente desprovido das características ondulatórias que demonstrara no teste com dois orifícios.
Os resultados desta experiência definiram o princípio básico da física quântica, a dualidade onda-partícula, que determina que partículas atômicas podem se comportar tanto como corpos materiais, quanto como ondas.
Este enunciado estabelece a mecânica quântica como uma ciência probabilística, que ocupava o lugar da ciência determinista dos séculos anteriores. Falar em dualidade e incerteza, em oposição ao determinismo, pode dar margem à impressão incorreta de que a física quântica seja alguma forma alternativa de ciência, que rompe com os modelos matemáticos convencionais. Talvez por isto, esotéricos, místicos e terapeutas holísticos gostem tanto da ideia – interpretam de modo subjetivo, tal como se suas interpretações fizessem parte do evento percebido pela ciência.
Enquanto a física começava a se deparar com o horror da indeterminação, os matemáticos sonhavam com a pureza absoluta da lógica. Diziam que, exatamente, por ser abstrata, a matemática poderia ser o fundamento claro, último e absoluto de qualquer ciência. Encontraríamos todos os seus limites.
Não foi bem assim o final da história (como vimos). Mais tarde, o teorema de Gödel demonstrou o contrário, para a infelicidade daqueles que sonhavam.
Assim, esses são os dois problemas indiscutíveis que limitam a ciência, mas ainda não são as únicas pedras que estão no caminho daqueles que buscam a investigação de uma suposta verdade. Embora possa ser acusado de “ciência irônica”, não posso negar minha percepção;
John Horgan é um jornalista, ex-editor da revista Scientific American, que dedica porções consideráveis em uma crítica voraz para o que chama de ciência irônica – talvez o maior militante. Horgan procura demonstrar que, nos casos mais citados da literatura, tais afirmações sobre os limites não se teriam comprovado. Os cientistas, para Horgan, seriam figuras igualmente retardatárias e trágicas, que devem carregar o peso, ainda maior, de belas e verdadeiras teorias associadas aos nomes de Newton, Darwin e Einstein. Não devemos desmerecer Horgan, mas como Thomas Kuhn, sabiamente, nos mostrou, a ciência não é feita de conhecimentos cumulativos, o que não a impede de que por vezes os tenha.
Kuhn assemelha a ciência à estrutura arquitetônica de uma casa, onde em certos momentos só a simples quebra de um banheiro, ou a troca completa das telhas não é suficiente. Algumas vezes, em busca do melhor para a construção, é necessário derrubar toda a casa e começar a construí-la do zero novamente – assim seria a ciência em busca de certezas.
Horgan critica Roger Penrose, afirmando que, em geral, “ele e os outros de sua espécie só têm uma opção: explorar a ciência de modo especulativo e pós-empírico”, o que chama de ciência irônica. Diz ainda que “essa ciência irônica se assemelha à crítica literária por oferecer pontos de vista, opiniões que são, na melhor das hipóteses, interessantes, provocando outros comentários. Mas elas não convergem para a verdade. Não pode realizar surpresas empiricamente verificáveis que forcem os cientistas a fazer revisões substanciais na sua descrição básica da realidade (HORGAN, John. O fim da ciência: uma discussão sobre os limites do conhecimento científico. São Paulo, Companhia das Letras, 1998, p. 18)”.
A afirmação de Horgan é no mínimo injusta, desmerecendo um trabalho que contribui para uma investigação humana, mesmo que não possam ser feitas verificações ou observações. Lembremos que a ciência surgiu, a priori, da filosofia, e quando o filósofo não tem mais perguntas, o cientista perde o rumo. Não tenho mais nada a dizer sobre o Horgan.
Para aqueles que compreendem a filosofia como a raiz do conhecimento humano, o cerne das perguntas e caminhos a seguir, estará claro; lá vai, não mais um problema, mas uma pergunta: Existiriam limitações na nossa linguagem científica perceptiva com que vemos o mundo e o prevemos?
Neste último aspecto, o ponto mais significativo é a distinção entre o mundo tal como ele realmente é, e nossa percepção e apreensão do mesmo. Nesta distinção, feita cuidadosamente pelo argumento do filósofo alemão Immanuel Kant, no século XVIII, incita que a nossa apreensão do mundo sempre foi processada através dos conceitos mentais fornecidos pelo nosso cérebro. Assim, algo sempre seria deixado de fora ou distorcido dentro desse processo, e o real nunca alcançado. Não poderiamos ter acesso à verdade nua e crua - não expurgada sobre as coisas.
Sempre deve haver uma lacuna entre a realidade e o nosso conhecimento sobre ela – seja objetiva ou subjetiva. Assim, Kant pode muito bem revelar, a partir do amor à sabedoria e os fatos apresentados pela realidade, que, há um limite fundamental para o nosso conhecimento das coisas: uma lacuna intransponível entre o que é, e o que podemos saber sobre. Enquanto esta lacuna é inegável, ainda há espaço para discutir sobre o quão grande é este abismo.
Mas o que Kant não sabia, e agora nós conhecemos, é que as categorias de pensamento que usamos para fazer o sentido do mundo são resultado de um processo de seleção natural. Eles têm presumivelmente sido selecionados para o sucesso em dar uma representação precisa das partes da realidade que são importantes para a sobrevivência dos organismos. Sem dúvida, um notável argumento do por que a imagem e impressão do mundo parecem ser tão semelhantes.
Talvez todas as fronteiras sejam ilusórias, sejam erguidas por nós mesmos através de nossa falta de informação sobre a natureza das coisas, ou pelas escolhas de um modelo simplista, ou mesmo um muito complicado, da realidade. Esta é uma questão que deve ser levada a sério. Todas as nossas tentativas de descrever o funcionamento da Natureza, e de prever ou controlar eventos futuros, são norteadas por uma base científica de métodos que constróem um "modelo" de como alguns aspectos da natureza operam.
Fazemos as mais diversas observações, completas e precisas, destas representações da Natureza - que podemos verificar e entender. Nossos modelos da Natureza são invariavelmente de caráter matemático. Isto não é tão exato quanto parece em primeiro lugar. Embora o forasteiro vê a matemática como uma forma friamente analítica de olhar para o mundo, é algo mais profundo do que isso: algo que está intimamente ligado a outras imagens humanas do mundo.
Na raiz, a matemática é o nome que damos à coleção de todos os possíveis padrões e inter-relações – isso na percepção, dito, lógica humana. Essa mesma percepção humana incapaz de compreender, com sua lógica, o comportamento apresentado pelo Princípio da Incerteza no mundo quantico, e que se depara com fenomenos não computáveis, paradoxos que não podem ser resolvidos, como bem percebeu Gödel.
Ambas as três barreiras partem de um fenômeno paradoxal sobre podermos saber sobre o que não saber.
A impossibilidade está na raiz de muitos dos florescimentos da imaginação humana - o conceito de impossibilidade, tanto como uma restrição em ações humanas, quanto por meio do contraste com o conceito de um Ser para quem nada é uma impossibilidade. Também tem desempenhado um papel estimulante na arte, filosofia, natureza da linguagem, verdade e lógica, nos afortunando com persistentes juros, levando a profundas novas considerações: o problema do infinito, a origem das forças naturais e a consciência humana. O desenvolvimento de descrições complexas do funcionamento do mundo físico parecem nos conduzir inevitavelmente a teorias que compreendem suas próprias limitações.
Para a simples contextualização de todo o transcorrer do texto, evoco Roger Penrose:
“...melhor expressa a minha posição sobre essa questão, onde cada um dos Três Mundos, platônico-Matemática, Física e Mental tem o seu próprio tipo de realidade, e onde cada um é (profundamente e misteriosamente) encontrado em um, que o precede (os mundos assumem um ciclo). Eu gosto de pensar que, em certo sentido o mundo platônico pode ser o mais primitivo dos três, já que a matemática é uma espécie de necessidade, quase evocando sozinha a sua própria existência através da lógica. Seja como for, há um rico mistério ou paradoxo, sobre cíclicos aspectos desses mundos, onde cada um seja capaz de abranger a um sucesso, na sua totalidade, enquanto si mesmo depende de apenas uma pequena parte do seu antecessor." (PENROSE, Roger. The Road to Reality. 2004, Pg.1028).
Talvez a ciência enfrente um destino subjetivo, considerado por muitos cientistas como um destino pior do que a própria morte da ciência. Independentemente de saber se tal especulação tem atrações especiais para o sucesso dos cientistas empíricos em determinadas fases de sua carreira, esta é realmente uma previsão sobre a natureza do Universo. É uma possibilidade de que existe um limite para o modo como lidamos com a observação sobre a natureza das coisas.
Haverá coisas que nós não podemos ver, eventos que não podemos gravar, possibilidades que não seremos capazes de prever e nem descartar. Quando isso acontece, tudo o que podemos fazer é pintar quadros de possíveis cenários que são consistentes com o pouco que sabemos. Mas as lacunas que permanecerem em nosso conhecimento vão permitir muitas possibilidades diferentes de existir. Considerando que essas lacunas formam uma pequena parte da ciência hoje, seu tamanho relativo pode crescer rapidamente.
Um dia, nossos descendentes poderão acordar e descobrir o quão grande seria a fronteira entre o conhecido e o desconhecido. É notado que, nos últimos anos, os pronunciamentos e as previsões da ciência tornaram-se cada vez mais ousadas e especulativas. Cientistas parecem ter deixado o papel de meramente descrever o que fizeram ou o que a Natureza é, ansiosos para contar o profundo significado de suas descobertas para uma gama cada vez maior de questões filosóficas, especular sobre o futuro - possibilidades de formas que parecem mais próximas do reino da ficção científica do que para a ciência de fato.
Alguns exemplos disso são: a busca para fabricar formas de inteligência artificial, a busca por seres extraterrestres avançados, a explicação dos sentimentos e emoções humanas através da evolução adaptativa, as possibilidades que a leitura do código genético da vida nos traz e a certa erradicação de doenças e prolongamento da vida humana.
Me parece que essa tendência para o transcendental na popularização da ciência nos aparece como um substituto para o suposto declínio das religiões atuais. Já outros, veem a ciência como uma fonte de ideias transcendentais alternativas, que nos levam para além da monotonia dos noticiários. Parece haver no ser humano um profundo desejo por algo maior que nós mesmos e pela compreensão do significado do Universo.
Para finalizar, é importante distinguir um olhar subjetivo visando o trancesdental, e o olhar subjetivo em busca da verdade – tal como a ciência surge. Caso nossa Ciência e percepção sejam limitadas à apreensão real do Universo, que seja sabido por todos os cantos do Universo que nós identificamos isto através da ciência e filosofia.
Olá! primeiramente eu queria parabenizar vocês pelo excelente trabalho. Texto extremamente bem escrito e fundamentado. Bem, vendo o interesse de vocês sobre a questão epistemológica dos limites da ciência, queria convidá-los a dar uma olhada numa nova concepção epistemológica do limite da ciência baseado na questão da origem da linguagem (Logos). é um trabalho filosófico que lança novas luzes sobre a epistemologia e os limites da ciência. Ele está exposto no blog alvissarismo.blogspot.com sob o título "Os limites da razão: Ciência x Insciência". Um grande abraço e, mais uma vez, meus parabésn pelo texto.
ResponderExcluirParabéns pelo texto ! Muito bem explicado !
ResponderExcluirA Ciencia delimita seu prórpio ponto de vista cientifica, onde a tése, é contestada pela sua própria antítese, que cria às divergentes opiniões pessoais pelo ponto de vista científico dos seus estudos, mas onde se concitua o limite ? Nas proporçoes dos domínios dos assuntos que os próprios prevalecem nosconhecimentos privados de cada um, aí é que vem doutrinariamente a prevalência de seus interesses, então onde devemos pousar o conhecimento ? A Visão epstemológica fazem diferença na prática de cada estudo, até quando prevaleceria tal tése científica, é a diferença do " prognóstico desse estudo" não pode ser creditado para todos.
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