sábado, 13 de outubro de 2012

MATEMÁTICA
A Linguagem do Universo?



Antes de mais nada, a Matemática é uma ferramenta, uma invenção que pretende encontrar lógica no mundo real físico e em sí mesma. Essa ferramenta não é capaz de olhar para fora, só usa, ou pode usar, a imaginação e lógica, ambas subjetividade. No entanto, não se engane, pode ser uma maravilhosa linguagem para descrever a natureza. 

A matemática é uma linguagem, e como linguagem atua no campo da comunicação, no entanto, possui algumas peculiaridades: a mesma vence, em alguns aspectos, uma das maiores dificuldades dentro do âmbito da comunicação, que é fazer com que a mensagem transmitida chegue sem interferência alguma até o receptor – fato  não alcançado por outros tipos de linguagem,  e que só foi encontrado neste tipo de linguagem, pois ela não se propõe a falar do mundo, mas sim de sí mesma. E, para que se utilize esta linguagem, é preciso seguir as regras e limitações, a rigor, propostas pela mesma.

A matemática não foi idealizada para que se possa conectar um mundo subjetivo de um homem ao de outro. No entanto, ela é capaz de fazer com que ambos se comuniquem dentro de uma realidade própria, criada pela mesma. 

Assim, é uma ferramenta incrível para encontrar respostas, quando estas forem possíveis, e denunciar contradições, com certa clareza inquestionável.

Todas estas qualidades permitem à matemática passar pelo método científico? Método este capaz de construir hipóteses, testá-las e realizar previsões – o que é chamado pela sociedade de comprovação científica.

Antes de tentarmos responder a esta pergunta, analisemos a história da matemática, para que possamos conhecer melhor o objeto estudado: 

No Egito Antigo, existia, e ainda existe, um rio muito grande e fértil, chamado de Nilo. Desde os primórdios da nossa espécie, com a descoberta da agricultura, é de conhecimento do ser humano o fato de que quanto mais próximo um plantio esteja do rio, mais fértil será a terra. Com isso surge um dos primeiros problemas a serem resolvidos pelo homem: dividir a terra de forma igualitária, e com determinado padrão. Ou seja, surge a necessidade de haver uma ferramenta capaz de fazer medidas da terra, dando inicio à Matemática: eis que surge a Geometria.

Os números, que é o que nos está condicionado a pensar quando nos remetemos à matemática, só vieram tempos depois. 

Dentre as sociedades mais desenvolvidas nestas técnicas estavam os Arábicos e os Romanos. Todo o desenvolvimento da matemática dos povos sempre esteve ligado aos seus conhecimentos e crenças, e com os numerais romanos não foi diferente.
 
Como a história nos apresenta, Roma invadiu a Grécia e a tomou toda para sí, destruindo grande parte de sua cultura (inclusive bibliotecas), mas também foi dominada pela Grécia, mas de uma forma diferente. Os gregos, por serem um povo de grande sabedoria (enquanto os romanos um povo de luta e ciência), acabaram transformando os sobreviventes da batalha em professores dos romanos, infectando-se como um vírus nas mentes destes.

Uma dessas infecçcões era a crença de que não existia “o Nada”, um resquício do pensamento de Aristóteles, que propôs ser o éter a natureza do nada.

O resultado foi que tanto no pensamento, quanto na matemática Romana, não existisse o conceito de nada. Os Números Romanos não possuem ícone algum que simboliza o nada, conhecido atualmente por nós, mais tarde, como o ZERO (“0”). Esta foi uma das razões para o obsolescimento dos Números Romanos, praticamente extintos, usados mais tarde, até hoje, somente em títulos em geral, notações, marcações datais de eventos, títulos de livros etc.

Um outro motivo pelo qual os Romanos tiveram muitos problemas com seus numerais foi o fato dos números ficarem extremamente grandes, quando usadas quantidades altas, o que dificultaria e atrasaria todo o raciocínio: I, II, III, IIIV, V, VI, VII, VIII, XI, X,L,C,M. Os números usados pelo povo ocidental até hoje são os bem sucedidos Números Arábicos: 0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11.

Podemos dividir a matemática em três campos: a geometria, a álgebra e a aritmética.

A geometria é o ramo da matemática  preocupado com questões de medida, forma, tamanho e posição relativa de figuras e com as propriedades do espaço. Euclides de Alexandria, professor e matemático, ficou conhecido como o “Pai da Geometria”, viveu em Alexandria durante o reinado de Ptolomesu I (323-283 a.C.) e sua obra, “Os Elementos”, é uma das mais influentes na história da matemática, servindo como o principal livro para o ensino de matemática (em especial a geometria), servindo de base até os dias de hoje.

Nessa obra, os princípios do que é hoje chamado de geometria euclidiana foram deduzidos a partir de um pequeno conjunto de axiomas (sentença ou proposição que não é provada ou demonstrada, e é considerada como óbvia ou como um consenso inicial necessário para a construção ou aceitação de uma teoria). Euclides também escreveu obras sobre perspectivas, seções cônicas, geometria esférica, teoria dos números e rigor.

A geometria euclidiana é caracterizada pelo espaço euclidiano, imutável, simétrico e geométrico, metáfora do saber na antiguidade clássica e que se manteve intocável, tal como uma crença, no pensamento matemático medieval e renascentista, pois somente nos tempos modernos puderam ser construídos modelos de geometrias não-euclidianas.
Euclides é a versão aportuguesada da palavra grega Εκλείδης, seu verdadeiro nome grego.
A álgebra é a "ciência da restauração (ou reunião) e redução", mas matematicamente seria melhor "ciência da transposição e cancelamento"- ou, ainda, a "transposição de termos subtraídos para o outro membro da equação" e "o cancelamento de termos semelhantes (iguais) em membros opostos da equação". Talvez um dos grandes precursores foi o estudioso Diofante de Alexandria, que viveu de 325 a 409 e seus estudos se basearam no uso de símbolos para facilitar a escrita e os cálculos matemáticos. Os Símbolos criados por Diofante fizeram com que as expressões, até então escritas totalmente com palavras, pudessem ser representadas com abreviações.

A passagem para uma álgebra completamente simbólica foi obra de René Descartes, grande matemático e filósofo francês, que introduziu as seguintes inovações para aperfeiçoar a álgebra de Viète:  criou o símbolo (.) para a operação de multiplicação, a notação que usamos hoje para os expoentes de uma potenciação e passou a usar as primeiras letras do alfabeto para os coeficentes da incógnita e os termos independentes (se literais) e as últimas letras para representar as incógnitas.

 A aritmética deriva do grego atithmos, que significa "números", e tem Brahmagupta (Bhinmal, Rajasthan, 589 — 668), matemático e astrônomo indiano, como percursor deste ramos da matemática. Vivendo a maior parte de sua vida em Bhillamala (atual Bhinmal) no império de Harsha. Foi o líder do observatório astronômico em Ujjain, e durante seu período lá escreveu quatro textos sobre matemática e astronomia: Brahmasphutasiddhanta, Cadamekela, Durkeamynarda e Khandakhadyaka. Considerado o pai da aritmética, seu trabalho teve impacto significativo nas construções matemáticas. Brahmagupta popularizou o conceito do zero e definiu regras para a aritmética com números negativos e com o zero, que são próximas ao entendimento atual da matemática moderna.

A maior divergência é que Brahmagupta tentou definir a divisão por zero, uma situação considerada inexistente na matemática moderna. Sua definição de zero como um número era acurada, exceto que ele considerava 0/0 igual a 0, sendo que considera-se atualmente que essa quantidade não pode ser definida.

 Em 628, Brahmagupta forneceu a primeira solução geral para a equação quadrática.   
Ainda, não poderíamos deixar de comentar sobre o Cálculo Integral e Diferencial de Isaac Newton e Leibniz que revolucionou não só a matemática, mas toda a ciência. Com o pretexto de encontrar uma lógica numérica capaz de interpretar e simplificar fatos observáveis na natureza, foi desenvolvido o cálculo integral e diferencial.

É preciso ser dito que a notação matemática moderna deixou a mesma muito mais fácil para os profissionais, mas muito mais difícil para os iniciantes, que normalmente acham isso desencorajador. Isso é extremamente compreensivo: alguns poucos símbolos contém uma grande quantidade de informação. Assim como a notação musical, a notação matemática moderna tem uma sintaxe restrita e informações que seriam difíceis de escrever de outro modo.


Na linguagem matemática, palavras como 'ou' e 'apenas' têm significados muito mais precisos do que a fala no cotidiano. Além disso, palavras como aberto e campo têm recebido um significado matemático específico. O jargão matemático também inclui termos técnicos tal como diferencial e integral. No entanto, há uma razão para a notação especial e o jargão técnico: a matemática requer mais precisão do que a fala do dia-a-dia. Matemáticos se referem a essa precisão da linguagem e lógica como: “rigor".

A matemática é mal vista por leigos e superestimada por aqueles que dominam sua técnica. Não posso deixar de alertar que ambos não a compreendem. Alguns abominam sua existência, já que não entendem por que raios existe esta coisa de confundir e sem lugar para chegar, enquanto outros adoram jogá-la, se divertem com os desafios e problemas sugeridos por ela, certamente pela facilidade que a vida lhes proporcionou. 

Orson Wells teve muita razão ao dizer: “Só um cínico sabe o preço de tudo, e o valor de nada.”

De forma muito superficial, e parcial, passamos por toda a história da matemática, e voltamos à questão deixada anteriormente: A matematica seria a linguagem do Universo?

Enquanto que, para Galileu (1564-1643), "A matemática é a linguagem com a qual Deus escreveu o Universo", pretendendo poeticamente dizer que a mesma é a linguagem do próprio Universo, para Bertrand Russel (1872-1970) não havia matemática pura, ou seja, sem objetos, sem axiomas, já que pensava que ela existia da própria condição do Universo. 

Para Kurt Gödel (1906-78), matemático alemão e naturalizado americano, em seu teorema da incompletude, qualquer sistema axiomático suficiente para incluir a aritmética dos números inteiros não pode ser simultaneamente completo e consistente. Isto significa que se o sistema é auto-consistente, então existirão proposições que não poderão ser nem comprovadas nem negadas por este sistema axiomático. E se o sistema for completo, então ele não poderá validar a si mesmo — seria inconsistente. Assim, a matemática não pode ser a linguagem do Universo, pois, em princípio, baseia-se em si só.

Este fato também foi estudado por David Hilbert (1862-1943), matemático alemão, que descreve o sistema axiomático, e afirma que a matemática enumera conceitos e relações básicas dos axiomas, e destes deduz todos os outros enunciados a partir das relações básicas. E nada além disso.

Não passa de um método lógico, segundo Wittgenstein (1889-1951), matemático e filósofo, que pensa as proposições da Matemática como equações, portanto pseudo-proposições, sabendo que a proposição matemática não exprime pensamento algum. 

De fato, nunca precisamos de proposições matemáticas na vida, mas as empregamos apenas com o fim de, a partir de proposições que não pertencem à Matemática, tirar conclusões que se expressam em proposições que tampouco lhe pertencem:

“As equações da Matemática correspondem às tautologias da Lógica e, como estas, nada dizem”. Ou seja, se por si só não se referem à realidade alguma, como poderiam realizar previsões?
 
O pai da semiótica, estudioso dos signos, C. S. Peirce (1839-1914) diz que a matemática é lógica, mas que (...) "enquanto a Matemática é o estudo que infere conclusões necessárias, a lógica é a ciência do modo de inferir conclusões necessárias". É interessante, assim, pensar as mesmas deste modo, e perceber que tal como podemos errar a partir de um pensamento lógico, quando não estruturado através de um caminho completamente algoritmado (onde não deixaríamos de ver um ponto sequer), o caminho contrário na matemática também é possível. Portanto, nos parece que a matemática se fará o mais útil e real o quanto mais perto da 'realidade' estiver o objeto de estudo. Caso contrário, se fará o menos útil e mais ilusória.

Mas nada disso pode diminuir a graça da Matemátca, nas palavras de Leibniz em  “Mathesis Universalis”, onde, de modo geral, a matemática é definida como uma linguagem para a fundamentação do raciocínio em todas as ciências. É o que afirma Russel quando diz que a matemática coincide com a Lógica, fazendo parte do raciocínio que nos permite avançar com mais brilhantismo até a ciência.

Mesmo que para alguns a Matemática seja considerada a Linguagem Universal, ainda não possuimos ferramentas o suficiente para tal conclusão, enquanto que, olhando pelo outro lado, mesmo que também nada se possa concluir, sabemos que a mesma não passa pelo método científico, e nem faz-se esta a sua função. A mesma é, e sempre foi, uma ferramenta poderosa para a construção do conhecimento humano, especialmente na investigação científica. 
 
Concluindo, a matemática é a ciência das regularidades, dos padrões. Segundo esta definição, o trabalho do matemático consiste em examinar padrões abstratos, tanto reais quanto imaginários, visuais ou mentais. Ou seja, os matemáticos procuram regularidades nos números, no espaço, na ciência e na imaginação e formulam teorias com as quais tentam relacioná-los a fim de explicar as relações observadas.

Como tudo o que surge de um cérebro e, consequentemente, da percepção que o mesmo realiza sobre o mundo, acaba sendo duvidoso, por sabermos que estamos condicionados a um sistema fechado - observando de dentro do sistema, a dúvida é a melhor companheira. 

Apesar de nomearmos a matemática como um estudo exato, lembremos que ela foi inventada por humanos, e, como observamos através deste texto, a história nos mostra que ela esconde muito de nossas crenças sobre o mundo que nos cerca. Sua exatidão é mera ilusão. Lembremos que as deduções lógicas dos teoremas sempre precisam partir de axiomas (as premissas da teoria sem a necessidade de embasamentos anteriores), e é na confecção destes axiomas que inserimos nossas crenças sobre o mundo.      
 
Ainda sim, isso não significa que devemos olhar decepcionados para a Matemática, apenas por a mesma não corresponder a este lado mágico que, inconsequentemente muitos a levaram - esta ferramenta não teve culpa alguma dos preconceitos que sobre ela depositaram. Olhemos a sua grandiosidade como apenas o mapear matemático sobre determinado objeto físico, e utilização de todo o conhecimento matemático abstrato constituído sem sequer imaginação ou relação com o objeto em sí anteriormente. Muito foi revolucionado e descoberto sobre o mundo a partir da mesma. 

Concluindo, a matemática é, sem dúvida, a melhor linguagem e ferramenta científica.

E, para aqueles que desejem se aventurar no mundo matemático, desafiando a natureza do próprio pensamento humano, faço minhas as palavras de Malba Tahan (1895 - 1974):

“Na Matemática, para saborear com prazer o fruto é preciso conhecer bem as suas raízes.”

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